Gosto de pensar que a mesma raiz etimológica liga, em grego, o adjetivo “belo” (kalón) e o verbo “chamar” (kaléo). A beleza é, assim, um chamamento. Toda a vocação humana é a resposta à atração de alguma coisa (ou de alguém!) que nos chama. Sem esse apelo fundamental, a nossa vida estaria privada de motivação e cada vez mais distante da sua realização autêntica.
A verdade é esta: se a alegria do encontro, se a surpresa de um enamoramento, de um “Que belo!” gritado com o coração, não antecede as renúncias ou os sacrifícios, estes não gerarão mais do que tristeza, frigidez, rigorismo e frustração. A vida não começa pela ética, mas pela estética. Avança não por obrigatoriedade, mas pela força da atração. Não avançamos vida afora por decreto. Como na parábola de Jesus, o ponto de transformação é a descoberta da pérola escondida ou do tesouro do campo. Só assim experimentaremos que lá onde estiver o nosso tesouro estará também o nosso coração (Mt 6,21). A Vida humana não é estática, mas sim extática. A vida é êxtase, movimento, desejo de unir-se ao objeto do amor.
fonte do texto:
MENDONÇA, José Tolentino. Rezar de olhos abertos. Lisboa: Quetzal Editores, 2020. p. 138
Disponível em <https://www.quetzaleditores.pt/produtos/ficha/rezar-de-olhos-abertos/21327223>